Metanol: fígado vira ‘vilão’ e transforma bebida adulterada em veneno silencioso
O Brasil corre atrás de um medicamento que pode significar a diferença entre a vida e a morte em casos de intoxicação por metanol. Trata-se do fomepizol, antídoto considerado referência mundial para esse tipo de envenenamento. Ele não tem registro no país e precisa ser importado de forma emergencial.
A busca ganhou urgência depois da identificação de casos em São Paulo e em Pernambuco. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) já acionou agências internacionais para importar o produto e lançou um edital para encontrar fornecedores que possam entregar o produto rapidamente ao Ministério da Saúde.
Infográfico explica ação dos antídotos em casos de intoxicação por metanol
Arte/g1
O que é o fomepizol
O fomepizol pertence à classe dos inibidores da álcool desidrogenase (ADH), enzima do fígado responsável por metabolizar tanto o etanol quanto o metanol. No caso do metanol, esse metabolismo é perigoso porque gera compostos altamente tóxicos — como o formaldeído e o ácido fórmico.
Quando o paciente recebe fomepizol, a droga bloqueia a ADH e interrompe essa transformação nociva. O metanol circula “intacto” no organismo, sem virar veneno, e pode ser eliminado naturalmente ou com ajuda da hemodiálise.
A hepatologista Natália Trevizoli, do Hospital Sírio-Libanês, explica que a droga é considerada “mais precisa, segura e rápida, sem causar os efeitos de intoxicação do etanol”.
Segundo ela, quando administrado cedo, o fomepizol impede a formação de ácido fórmico, protegendo olhos, cérebro e fígado, reduzindo o risco de sequelas irreversíveis.
Ministério da Saúde recebe 41 notificações de intoxicação por metanol; 37 delas em São Paulo
Reprodução/TV Globo
Como funciona o etanol puro
Na ausência do fomepizol, hospitais recorrem ao etanol grau farmacêutico como alternativa. O princípio é semelhante: o etanol também disputa a mesma enzima (ADH) e retarda o metabolismo do metanol.
“O etanol entra como antídoto, para competir com a ADH, manter a enzima ocupada e evitar que o quadro evolua”, explica a hepatologista do Hospital Nove de Julho Lisa Saud.
Segundo a médica, esse uso precisa ser endovenoso e é restrito a 32 centros de referência do Sistema Único de Saúde (SUS). “Na prática clínica de hospitais privados, não é algo disponível.”
Natália Trevizoli reforça que etanol e fomepizol funcionam como “bloqueadores” da ADH, mas lembra a diferença fundamental:
“O fomepizol é um tratamento mais preciso, seguro e rápido. O etanol, em excesso, também intoxica o organismo.”
Mesmo com fomepizol ou etanol, há situações em que o dano já está instalado.
“Se o paciente chega acidótico, com sinais oculares ou neurológicos, muitas vezes é indispensável associar hemodiálise, que atua como filtro externo para retirar rapidamente o metanol e seus metabólitos”, detalha Trevizoli.
Alertas pelo Brasil
Os alertas começaram em São Paulo, em meados de setembro, onde a maioria dos pacientes foi atendida após consumir bebidas adulteradas. Pernambuco, Recife e Distrito Federal também notificaram casos suspeitos, incluindo mortes em investigação.
Diante desse cenário, o Ministério da Saúde instalou uma Sala de Situação para acompanhar a evolução dos registros e coordenar ações com estados e municípios. Até que o fomepizol seja disponibilizado, médicos seguem recorrendo à hemodiálise e ao etanol farmacêutico nos centros especializados.
Antídoto do metanol inibe enzimas do fígado e impede formação de venenos tóxicos; entenda
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